"Olhos que não vêem, coração que não sente."
Era uma rapariga calma, simpática, um pouco tímida, honesta. Os seus cabelos loiros caíam suavemente nos seus ombros, os olhos azuis fixavam a água que corria no mar diante de si, os seus pés enterrados na areia fina, a sua boca pequenina e cor-de-rosa cantarolava uma canção num tom demasiado baixo para ser entendido por quem a olhava de longe. Contudo, perto dela notava-se dor na sua voz. Era uma música sobre sofrer, perdoar e voltar a sofrer. Os seus olhos transbordavam pequenas lágrimas, mas em abundância. Vista de longe, era apenas uma rapariga como as outras, feliz, a desfrutar da brisa marinha. Vista de perto, era uma rapariga frágil, com medo de sofrer, com dor a viver-lhe no peito.
- Não olhes assim para mim. - ela pronunciou baixinho.
- Só queria ter a certeza de que estás bem. - disse alguém que agora se sentava junto dela.
- Não te quero aqui, nem vou dar-te essa informação. - respondeu fria, como se nada a pudesse magoar, como se nada conseguisse expor o que ela sente.
Nenhum dos dois voltara a pronunciar-se. Após vinte minutos sentados juntos, a rapariga levanta-se e faz o seu caminho de volta a casa. Assim que consegue alcançar a sua cama, pega num caderno e começa a deixar transparecer tudo o que sente, escrevendo-o pelas linhas de cada folha. Não era apenas alguém que a conhecia que se havia sentado com ela na praia, esse alguém era o motivo da sua dor. Aos seus olhos, ele sempre a amara, ele sempre quisera ser tudo para ela, ela sempre fora o mundo para ele. Na sua cabeça, ele amara-a, mas acabara por se esquecer do quanto eram perfeitos juntos e abandonara-a. No seu coração, ele nunca sentira nada por ela, apenas a vira como uma amiga, gozara com ela e deixara-a. A confusão em si era visível na forma como cada letra era desenhada no caderno. Letras tremidas e fora das linhas. Era assim que a vida dela se encontrava: tremida e fora do caminho certo. Deixara tudo o que sentia escorregar para aquelas folhas do seu caderno e decidira que apenas haveria uma solução para tudo. A solução que ela escolhera para acabar com a dor e com a confusão fora fugir. Ela só poderia fugir. Fugir dele, fugir dela, fugir daquele lugar, fugir das lembranças, fugir dos sentimentos, fugir de tudo.
"Olhos que não vêem, coração que não sente." Se fugisse, os seus olhos nunca mais se cruzariam com os dele, com os lugares em que eles sempre se encontravam; os seus olhos nunca mais o veriam e o seu coração nunca mais sentiria o mesmo por ele. Era a única solução e a decisão fora tomada. Fugiria, não veria, não sentiria... nunca mais.
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